Olá! Esse é o boletim #28 da revista USINA!
Mensalmente enviamos uma seleção de conteúdos da revista USINA, como entrevistas, ensaios, artes visuais, instantâneos, poesia e tudo mais.
Se você curte nosso trabalho, considere nos apoiar de forma recorrente. Sua colaboração é essencial para manter a USINA viva e seguir produzindo conteúdo com a qualidade e o cuidado que sempre dedicamos às artes e ao pensamento. Com o seu apoio, podemos não apenas sobreviver, mas também crescer e realizar projetos ainda mais significativos. Estamos planejando o lançamento de novos livros e, finalmente, uma USINA impressa com tiragem regular ainda para este ano. Contamos com você para seguir adiante.
Nessa edição: uma entrevista da série Conversas com Jandir Jr., o filme “O Alquimista do Som” sobre Walter Smetak, a composição “Sequenza III” de Luciano Berio e as fotografias da série “trigramas” por Vitor Faria.
Entrevista
Conversa nº3: Jandir Jr.
no dia sete de maio de dois mil e dezessete, encontrei jandir jr. em frente ao centro cultural do banco do brasil, logo após seu horário de trabalho no museu de arte do rio. sentamos num dos bancos bem perto da pira olímpica. observamos uns policiais do exércitos, jovens como nós, andarem em dupla pra cima e pra baixo. quando a noite começou a chegar, iniciamos a gravação. quando a entrevista acabou, atravessamos a rio branco quase por inteira: da presidente vargas à cinelândia e, ao final, nos despedimos na augusto severo. a noite já estava forte, e observamos com calma e cuidado a cidade ao nosso redor. (…) jandir é artista, educador e, no cotidiano, propõe incongruências, pausas, que nos apresentam com espanto aquilo que tomamos como dado. a desautomatização, o invisível naquilo que aparece, parecem ser alguns cuidados no seu olhar dedicado e amoroso, que nos leva ao movimento e nos impele à criação.
G: Em um primeiro momento, a minha ideia é discutir uma tensão que sinto no que você faz, entre o anonimato e a visibilidade, entre o que você coloca como uma ocupação de certos espaços de legitimidade da arte e ao mesmo tempo uma recusa desses espaços. Talvez uma tentativa de construir outro caminho… Não sei, não sou crítico de arte nem um conhecedor profundo, mas pelo que vejo tem essa questão. Queria que você começasse falando um pouco disso…
J: Acho que essa parada da fala não autorizada e do lugar específico da arte tem a ver com um mal estar em relação à circulação dos trabalhos de arte, principalmente. Primeiro porque tem um mal estar com relação à formação. Eu encontrei um ambiente no período de formação acadêmica que entrava em embate constante com o que eu acreditava que era arte anteriormente a isso.
A orientação que encontrei nesses lugares de formação, de cursos livres e acadêmicos, direcionam pro circuito estabelecido que diz respeito às instituições, às galerias, ao mercado de arte, né. E, claro, isso não me tocava, e acho que não tocava muitos dos colegas com quem eu trocava ideia. Mas, pra além disso, também tem a ver com a crítica social, vamos dizer assim, ampla: crítica racial, crítica econômica, situação socioeconômica… Por um lado, consigo ver uma vontade de conciliar o desconforto com algumas instituições do circuito tradicional, com a vontade de ter um contato mais puro, mais liberto com a arte. Por outro, vejo um mal-estar muito grande entre esse circuito e a produção periférica. Parece que as coisas não se conciliam.
Por conta disso, acho que comecei a querer buscar o anonimato, a invisibilidade. Essa vontade de diluir meu gesto já estava recorrente no meu trabalho de outras formas. Depois é que comecei a incorporar isso pra outras formas que não só no trabalho finalizado. Quer dizer, eu poderia finalizar um trabalho, resolver esse anonimato dentro dele mesmo e expor num circuito tradicional. No entanto, acho que a vontade agora é de buscar outra forma de circulação.
Cinema
O Alquimista do Som - José Valter Lima
O Alquimista do Som é um curta-metragem documental de 1978 que apresenta o músico e pesquisador Walter Smetak, figura marcante na música brasileira ao radicar-se em Salvador como professor da Escola de Música da UFBA e inspirar uma geração de artistas com suas percepções e ideias inovadoras sobre o som. Com direção do cineasta baiano José Valter Lima, fotografia de Mario Cravo Neto e montagem de Ricardo Miranda, o filme mergulha no universo do compositor de forma poética e experimental, começando com uma longa sequência que ressalta seu caráter esotérico, seguida de um depoimento do próprio Smetak enquanto o vemos em sua casa/ateliê. O filme registra também algumas de suas esculturas sonoras e destaca o trabalho de pesquisa e invenção do autor.
Walter Smetak (1913-1984) nasceu na Suíça e estudou música desde à infância, tornando-se um exímio violoncelista. Em 1937 mudou-se para o Brasil onde se estabeleceu, até que em 1957 foi convidado pelo também músico e professor Hans-Joachim Koellreutter para lecionar na Universidade Federal da Bahia. Em Salvador, além do magistério e da participação na Orquestra Sinfônica da Universidade, Smetak ficou conhecido pela oficina que montou nos porões da Escola de Música para explorar a construção de instrumentos, prática que rendeu uma centena de invenções ao longo dos anos e foi determinante, por exemplo, para a formação do Grupo Uakti.
Entusiasta da improvisação e do microtonalismo, Smetak registrou suas experiências em dois LPs, Smetak (1975) e Interregno (1980). Em 2008 o pesquisador e músico Marco Scarassatti publicou o livro Walter Smetak: O alquimista dos sons, em que aborda toda sua trajetória artística e processo de criação.
Música
Sequenza III - Luciano Berio
Luciano Berio (1925-2003) foi um compositor italiano de vanguarda. Iniciou seus estudos musicais com o pai e o avô e depois se formou no Conservatório de Milão. Conheceu a cantora Cathy Berberian – que, além de marcar definitivamente sua obra, também se tornou sua esposa. Foi influenciado pelo dodecafonismo e participou dos cursos de Darmstadt, entrando em contato com Boulez, Stockhausen e Ligeti. As Sequenza, série de obras para instrumentos solo escritas entre 1958 e 2002, exemplificam sua busca por expandir as possibilidades técnicas e expressivas dos instrumentos. Entre elas, a Sequenza III (1965), escrita para voz feminina e dedicada à Cathy Berberian.
Aqui, a peça é interpretada por Laura Cattani, cantora italiana reconhecida como uma das principais sopranos em atividade. É famosa por suas interpretações de obras associadas à vanguarda musical. Formada no Conservatório Giuseppe Verdi de Milão, estreou papeis em óperas contemporâneas, além de atuar em repertório tradicional, particularmente Mozart. Sua atuação estende-se à música de câmara e à música contemporânea.
A obra utiliza uma notação vocal expandida, com técnicas não convencionais para o canto – como gemidos, sussurros, gritos etc. A partitura também indica estados de tensão e urgência, e substitui os tradicionais compassos por uma orientação temporal medida em segundos, onde figuras rítmicas tradicionais sugerem apenas caráter geral (rápido ou lento), sem valores precisos. Essa abordagem desafia convenções, equilibrando precisão composicional e liberdade interpretativa. Ao explorar sonoridades vocais expandidas, a peça consolida-se como um marco da vanguarda do século XX, alargando os limites da escrita musical e das possibilidades expressivas da voz humana.
Fotografia
Céu - Vitor Faria
Esta seleção de fotografias faz parte da série “trigramas” (em construção), dedicada à registrar os 8 elementos da natureza de acordo com o I Ching, antigo oráculo chinês que através da combinação de linhas sistematiza a constante mutação do universo.
O que é a USINA?
A USINA existe desde 2013 com o intuito de contribuir para a convergência de discussões contemporâneas e afirmar nas artes e no pensamento um lugar de brincadeira, exercício, experimentação e diversidade.
Contos, poemas, traduções, entrevistas, ensaios, artes visuais, curtas metragens, fotografias: propomos através de vários meios e temas a articulação entre diferentes artistas, obras, tempos e tradições.
USINA, pode tudo só não pode qualquer coisa.
O boletim é gratuito e se você não quiser mais receber é só apertar o botão de “unsubscribe” ao final da página.
Obrigada por ler o Boletim da revista USINA!